No ano passado, apenas os servidores do Judiciário e do Ministério Público da União pressionaram o governo por reajuste salarial. Com o apoio dos partidos aliados no Congresso Nacional, a presidente Dilma Rousseff disse não. Este ano, Dilma enfrenta reivindicações salariais dentro de casa, pois os auditores fiscais da Receita Federal já iniciaram operação padrão por tempo indeterminado. Eles costumam ser acompanhados pelos servidores da Polícia Federal e da Secretaria do Tesouro Nacional. A greve dos professores universitários já dura mais de um mês e outras categorias de servidores da União também ameaçam parar.
A principal reivindicação dos titulares das chamadas carreiras de Estado é de reposição salarial para compensar os efeitos da inflação, que no Brasil ainda é muito elevada. Os auditores fiscais, por exemplo, querem 30,18% de reposição salarial. Outros sindicatos de servidores reivindicam uma "reposição emergencial" de 22%. Todos protestam contra o que chamam de "congelamento" dos salários que estaria sendo promovido pelo atual governo.
Depois das reestruturações de numerosas carreiras feitas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, principalmente entre 2008 e 2010, o governo parece ter errado ao não ter concedido um reajuste linear aos servidores para preservar o poder aquisitivo de suas remunerações. A possibilidade desse reajuste linear está prevista na Constituição e consta, todo ano, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), mas ele nunca é concedido. Esse aumento poderia ter sido dado com base na inflação futura e não em relação ao passado, evitando, assim, a ameaça grevista deste ano.
Governo pode ter até R$ 20 bi para reajuste salarial
As reestruturações de carreiras feitas no governo Lula resultaram em aumentos salariais em até quatro parcelas. A presidente Dilma ainda está pagando este ano os benefícios dados pelo ex-presidente para algumas categorias de servidores. Os aumentos parcelados mantiveram os servidores do Executivo quietos no ano passado, o que não aconteceu com os seus colegas do Judiciário. Este ano, a maioria deles não terá reajuste e a perspectiva de permanecer sem revisão dos salários em 2013 incentiva a luta em defesa de uma reposição salarial.
Há também uma lista de reivindicações setoriais e uma específica que também estimula a mobilização dos servidores. A lei 12.277, de 2010, criou uma estrutura remuneratória para cargos efetivos de engenheiro, arquiteto, economista, estatístico e geólogo. Agora, os cargos efetivos ocupados por outras categorias, como médicos e administradores, por exemplo, reivindicam uma equiparação, segundo informa o secretário-geral do Sindicato dos Servidores Públicos Federais no Distrito Federal, Oto Pereira Neves. "Estamos lutando por isonomia dentro do próprio Executivo", explica.
Nesse momento há uma luta nos bastidores da Comissão Mista de Orçamento do Congresso em torno de aumentos salariais. O Judiciário e o Ministério Público da União (MPU) desejam que o relator da LDO, senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), coloque em seu parecer um dispositivo que obrigue o governo federal a incluir no projeto de lei do Orçamento de 2013 as suas propostas orçamentárias, com os reajustes salariais para os juízes e demais servidores.
Com esse dispositivo, eles esperam evitar o conflito ocorrido no ano passado, quando a presidente Dilma Rousseff decidiu não acolher as propostas de aumento salariais feitas pelo Judiciário e pelo MPU. A dificuldade do relator em acolher essa reivindicação é que o secretário do Tesouro, Arno Augustin, manifestou sua oposição a esse tipo de iniciativa, quando participou, recentemente, de audiência pública na Comissão de Orçamento. Para Augustin, a definição sobre as despesas salariais dos três Poderes deve ser feita apenas na proposta orçamentária.
Essa questão, no entanto, poderá ter outro encaminhamento se, até o envio da proposta orçamentária de 2013 ao Congresso, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir sobre a ação impetrada pela Associação Nacional dos Agentes de Segurança do Poder Judiciário da União (Agepoljus), que questionou os procedimentos adotados pela presidente Dilma no ano passado. A ação tem parecer favorável do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que pediu para o STF "exortar a presidente da República a incorporar, na proposta orçamentária de 2012, as propostas do Judiciário e do MPU".
É pouco provável, portanto, que a presidente Dilma diga não novamente às reivindicações salariais dos servidores federais. Por isso, é importante analisar as repercussões de eventuais aumentos dos servidores nas contas públicas em 2013. Em primeiro lugar, Dilma poderá adotar a estratégia do parcelamento do reajuste, como fez Lula e, dessa forma, diluir ao longo dos próximos anos o impacto no caixa do Tesouro Nacional. Pode ainda conceder aumentos em meses diferentes para categorias diferentes, reduzindo a repercussão sobre a folha de pagamento do próximo ano.
É importante observar que, no governo do PT, o gasto com pessoal, em comparação com o PIB, atingiu o seu pico em 2009, quando correspondeu a 4,74% do PIB. Desde então, passou a cair. Em 2010, a despesa foi reduzida para 4,66% do PIB e, no ano passado, ficou em 4,38% do PIB. Para este ano, a última previsão do governo é que o gasto fique em R$ 187,6 bilhões, o que corresponderia a 4,1% do PIB. Nesse período, portanto, a despesa com o pagamento de pessoal ativo e inativo cresceu menos do que o PIB, mesmo com todos os reajustes que foram concedidos nos últimos anos do governo Lula.
Se o governo mantiver o gasto com pessoal em 2013 no mesmo patamar deste ano, ou seja, em 4,1% do PIB, ele terá um espaço fiscal de cerca de R$ 20 bilhões para aumentos salariais dos servidores, desde que a economia cresça no próximo ano de 4% a 4,5%, como prevê o Banco Central. A perspectiva fiscal não é, portanto, preocupante, mesmo porque a outra grande despesa (os benefícios previdenciários) terá uma pequena expansão, pois o reajuste real do salário mínimo será de apenas 2,7%.
Texto extraído de: Valor Econômico